17.11.11

Espero de esperança, espero de aguardar

Eu escuto sobre os teus dias iguais e conto sobre os meus dias que têm sido iguais e sem você, e espero por um futuro próximo onde eu possa passar meus braços em torno da sua cintura e te ouvir reclamar: do tempo, da minha ausência, que eu ando comendo de menos e estudando demais, que eu sou muito distraída, que eu não me vejo com clareza e que muitas coisas mais. Eu quero os teus ciúmes sem fundamento e os fundamentados, e quero os desentendimentos bobos e nossos acertos. Espero por um futuro próximo, chegar cansada depois de uma tarde de trabalho e poder dizer que tudo tem sido sempre a mesma merda e então que você me acalme com meus beijos e venham os teus carinhos, a parte da rotina que eu aguardo de fato. E eu vou te preparar o café n’algumas manhãs e vamos ler os jornais aos domingos, e em algumas dessas leituras nós vamos chorar porque o mundo anda um horror, menina, vem cá, me dá um abraço, eu escondo meu rosto no teu pescoço e lembro teu cheiro - e de repente, por um instante maior e mais importante que todos os outros eu esqueço a guerra e as barrigas vazias de todos os brasileiros porque eu te tenho, meu bem. Meu bem, meu amor, eu confesso que penso demais e tento tanto pôr em ordem tanto sentimento que mal têm cabido no meu coração; e é tanta filosofia ética psicologia biologia e logias e sofias e o tanto que me afeta o meu afeto por ti que, quando tento pôr em prateleiras separadas as minhas sensações, tudo o que me vem à mente é: ela gosta de tulipas. E não tem sido ninguém além de você, e nada além de escuta-aqui-essa-música-lembrei-de-você e quero-segurar-tua-mão-nessa-cena-no-cinema. O tempo se arrasta e já fazem três meses que eu conto os três meses que me faltam pra poder te encher de beijos, mas eu espero (de esperar) que os dias se tornem mais breves e eu espero (de ter esperanças), quando eu estiver ao teu lado, poder segurar o tempo e finalmente segurar tua mão. 

15.11.11

Fartura em meio à miséria


Entra, pode entrar. Sim, pode apanhar uns cigarros do maço na mesinha. Logo mais a gente toma alguma coisa – um vinho, um café, os dois. Mas fecha a porta, que detesto que a deixem assim, escancarada depois de entrar. Que se esqueçam de fechá-la. Que se esqueçam. Que me esqueçam. Engraçado, né?  Dizer isso logo agora que pretendo deixar meu peito escancarado. Pode abrir a janela, se quiser. De nada adianta deixar fechada por causa da chuva lá fora. Chove aqui dentro, também, e há dias que meus olhos estão nublados. Na verdade, não sei se fazem dias ou semanas ou alguns meses – cerca de dois deles. Já considerei religião, cartomancia, yoga, macrobiótica, suicídio, droga, alcoolismo. Mas pra quê? Não sei se isso – essa coisa que eu não sei o nome e me causa as tempestades mentais e me nubla os olhos e me põe  a suspirar pelos cantos, desanimada dos pequenos prazeres que tanto me alegravam há algum-tempo-atrás (indefinido); não sei se é pedaço que falta, se é alma que sobra e dói e adormece por se espremer demais dentro d’um corpo que ela jamais aprendeu a amar. É medo, é sufoco, é uma mescla de sei-lá-o-quê com você-sabe-muito-bem. Ando um poço de. Desesperanças ou uma fé densa, hora poço repleto e hora alma-vazia-e-esburacada. Recentemente descobri esse fio que divide meu espírito em muitos. Aceito, então, que em um instante se arrebente a corda entre o samba e o blues, a euforia e o desespero, a apatia e a temperança (e entre essas duas últimas eu quase não sei diferenciar, que a temperança é cálida-quase-fria e a apatia é fria-quase-cálida). Corrigindo-me, como se eu rabiscasse as linhas anteriores e dissesse que ando, não um poço de, mas poças, muitas, de águas enlameadas, límpidas, mornas, geladas, turvas e. Minha alma esburacada em pequenas grandes profundas e rasas poças: algumas, confesso, apenas buracos vazios – o fundo deles em erosão, ou terra batida e seca ou úmida e fértil. O grande perigo da alma fértil é que nela posso cultivar sentimentos bons ou culpa. Dessa forma, sinto-me culpada por um cigarro que acendo ou por qualquer mentirinha boba, por tratar-me bem demais ou mal demais, por fazer ou deixar de. É preciso exorcizar essas poças, mas. Chove cada vez mais. Vasculho-me por dentro em busca de alguma compulsão ou mania antiga que me faça sentir mais viva. Listo em minha mente todas as coisas boas que podem me acontecer e procuro a positividade que eu costumava abraçar e transbordar, mas a chuva não me deixa escutar. Minha única vontade é de sentar-me à janela e aguardar que o futuro traga suas mudanças, que a tempestade traga a bonança, que o tempo traga Janeiro, que o mundo traga notícias dela.
“Dela” – e finalmente me ocorre um bom pensamento bom. Ao fundo de todas as sensações: desesperanças, mágoas, e temores, John Lennon canta Bony Moronie. Não posso deixar de sorrir. Veja, estou aqui escancarando o meu peito e abro a porta e coloco as mãos para fora da janela e volto encharcada, para que em todas as poças secas da alma eu possa cultivar pensamentos como esse. Abro a garrafa de vinho. Abro um sorriso. Abro os braços. Confesso, ainda sinto medo. Ainda sinto-me “como quem partiu ou morreu”. Os pequenos gestos me doem como o inferno: rir, tirar os cabelos dos olhos, esmagar a ponta do filtro na mesinha-de-cabeceira deixando uma pequena marca de queimadura. Mas. E ah, e eu, que sempre tanto detestei a palavra “mas”, aguardo: notícias dela. Ela. Dedos entrelaçados. Seu carinho. E
gra
du
al
men
te
& depois
de-repente: não me sinto mais miserável assim. 
Uma  semente e terra fértil se tornam fartura em meio à miséria.