28.9.11

Carta de saudade

Verdes. Eles são verdes. E os meus, castanhos, que se fechem mais cedo todas as noites para que este (não tão) curto período período de tempo dure ainda menos. Tento distrair-me com qualquer coisa que não os segundos, dias, eras. Meu desejo é o de que os meses passem logo e que o vento te traga. Permaneço no teu aguardo, e, mesmo assim, não há ausência sua. Pelo contrário, você se faz presente em cada um de meus dias em meus pensamentos e em mim (muito embora, por mais que eu me encontre repleta de ti, nunca é o bastante e ainda peço por mais). Meus sorrisos, por e para você. Repito: permaneço no teu aguardo, e digo ainda mais, vivo no anseio desse aguardo. Minhas horas se fazem com a espera de notícias tuas, minha alegria se faz numa coleção de carinhos teus. E o meu amor meu amor se faz, meu amor vem sido você, amor, e eu espero que as coisas sigam dessa maneira por muito mais tempo.
A espera dói, mas a esperança não morre, e minha única prece é para que não te esqueças de mim. Vem logo! Vem e fica fica aqui, do meu ladinho. Entenda, por favor, que não quero dizer que você já não está ao meu lado, porque está. Estar perto não é físico. Mas você também entende (eu sei que me entende) o quanto eu quero te prender num abraço forte e sem fim, entrelaçar meus dedos nos teus e estar perto de ti de todas as maneiras possíveis: alma, mente, coração, braços, boca, nuca, mãos (...). E se existe este sentimento de segurança –  sempre existe  preciso confessar que realmente sinto-me dividida: entre ti e a saudade que me fazes.

Veja bem além destes fatos vis.
Saiba, traições são bem mais sutis.
Se eu te troquei não foi por maldade.
Amor, veja bem, arranjei alguém
chamado "Saudade'.

23.9.11

Tudo vai ficar melhor

Eu acredito que certas coisas são medicina alternativa pra qualquer tipo de doença que venha, sabe? De corpo, de alma, da mente. Não é preciso nem consulta e nem receita. Banho, presente, sorriso, brigadeiro de panela, flor roubada, andar descalço em areia de praia (na beira do mar, deixando o que restou das ondas roçarem nas laterais dos pés), canto alegre de passarinho solto, beijo (melhor ainda se for teu), incenso, escrever, abraço forte, cerveja em final de tarde, massagem, soneca da tarde, roda de violão, uma história engraçada, alguém que lembrou de você, carta, bilhete, mãos dadas, pôr-do-sol alaranjado e rosado, entrar numa calça que já não servia mais, receber bom dia de algum velhinho desconhecido ou achar uma moeda no chão.
É verdade que talvez eu nunca alcance o meu feliz para sempre, e eu sei que a o mundo não é sempre fácil - mas é sempre tão, tão bonito! Guardo no coração um otimismo bobo de que um dia as coisas vão dar certo, mesmo que eu não viva pra ver esse dia. Levo também, nesse mesmo coração (que tantas vezes já caiu, se machucou, se partiu e insiste em continuar de pé, olhar com entusiasmo para o alto e não ver por onde anda) uma fé esperançosa na humanidade, acreditando que a cada três passos que ela dá, são dois e meio para trás, o que é muito pouco, eu sei... mas um dia a gente chega lá. Tem gente morrendo de fome, tem gente morrendo em guerra, tem gente que não quer mais viver, eu sei. Às vezes, tudo é tão triste! Mas eu repito: é sempre tão, tão bonito. Continuemos. Não há problema em chorar, não. Eu choro. Sangro. Também reclamo, confesso, e também penso muitas vezes que não tem mais jeito. Mas eu acredito em um beijo teu, em um abraço nosso. E tudo vai ficar melhor.

19.9.11

Eu vou tirar você desse lugar

Senta aqui do meu lado, me dá a mão. Gosto tanto quando, assim, sem que eu te puxe e sem que eu te peça, quando você me abraça. Parece besteira (e é), mas eu fico sem querer soltar. Ainda mais quando faz frio – e  já notou que toda a noite em que a gente se encontra eu começo a tremer? Gosto de você. Você me faz querer dizer infinitas vezes. Gosto de você. Lembro de ti quando eu escuto aquela música (aquela que eu já escolhi pra ser nossa sem ao menos te avisar). Lembro de ti quando eu não escuto música nenhuma. Penso em você. E eu fico o tempo todo desse jeito: meio boba, meio com medo, meio distraída. E eu ponho a canção pra tocar de novo: já faz parte da rotina, da mesma forma que eu queria que seus abraços também fizessem. Seguro a sua mão e tenho vontade de te levar comigo pra longe, pra algum lugar onde a gente possa ficar sozinha, qualquer lugar que você goste, que você queira. Pra te ver feliz, o que eu não faria? Eu já te disse tantas vezes que quero cuidar de ti!  Quero cuidar do seu sorriso, pra que ele fique sempre aí, e quero cuidar também das suas lágrimas, cuidar de você. E não há noite em que eu não deseje ir até onde você está só pra te abraçar e poder dormir bem. Você, que é tão pequena, e eu, que sou tão... sou tão - desastrada, descuidada, desatenta e distraída. E eu, que tento ser o melhor pra você. Que hoje vivo tão ocupada: hora pensando em você, hora imaginando se você também pensa em mim. Eu, que tenho medo dos seus medos, do seu passado, do seu afeto. Tudo o que me nutre me destrói, disso eu sei, e se fosse um beijo seu o meu alimento, essas noites todas eu passei em jejum. Tenho fome. 
É verdade que vai doer. É verdade que você vai me machucar e que talvez, algumas vezes, eu te enfureça com meu jeito de ser. É provável que você  se canse. É verdade. Mas também é verdade, eu asseguro, que a gente vai ser muito feliz. Que eu vou me alegrar só de te ver rindo, que vou me esforçar pra tentar te fazer o mesmo bem que você me faz. Menina, também é verdade que quem mais te faz sorrir é a mesma pessoa que mais pode te fazer chorar. Tudo bem, eu aguento. A gente cresce. Só tô te pedindo, por favor: cresce do meu lado.

9.9.11

"CAMPOS DE MORANGO PARA SEMPRE..."

Nem a selva de pedra, nem a seca e nem as pragas jamais atingiram aqueles campos de morango. A irrealidade é eterna, pensei. Ela não acaba nunca. A única coisa que me lembrava constantemente do mundo real era aquela tosse irritante, um aviso de que meus pulmões e minhas vísceras apodreceriam. Tudo bem! A fantasia era permanente. Eu podia ser Satine, o diamante cintilante, sôfrega de tuberculose, o grande mal da revolução boêmia. Isso explicaria a minha tosse e eu nem sequer precisava abrir os olhos. Pereceria coberta por uma névoa de melancolia romântica. E os morangos continuariam a frutificar.
Veja bem, aqui não existem guerras, já que não há gente. As fadas nunca foram embora e a nascente continua a fluir, incessantemente e alimentando essa mesma terra há mais de mil anos. Aqui as flores não murcham. As borboletas não morrem, os pardais não transmitem doença. A minha insanidade é perfeita. É como se a loucura me tivesse presenteado com um dom de divindade particular. Esse era meu mundo. Claro que há tristeza. Ninguém quer uma garota louca. Esse mundo não apagou as cicatrizes e nem aplacou a solidão. Existimos: eu, as coisas que eu leio, as coisas que eu escrevo (nesta ordem) e agora aqueles campos de morango. Mas o que eu quero dizer é que havia ali apenas espírito, e o físico já não mais importava. Não era preciso comer, vestir; ali se respirava por puro capricho e desejo de apreciar o ar limpo, e se podia chorar à vontade caso desejássemos lavar a alma. O corpo, a carne, o sangue, os punhos cortados se foram. Viver é mais fácil de olhos fechados. E, estando consciente de que tudo isso não passa de uma imaginação minha (o que não quer dizer que não seja verdadeiro), mergulho e abraço a bem-vinda maluquez por mais alguns minutos, antes que os raios do Sol legítimo me obriguem a ir embora.

7.9.11

BOSQUE DOS JASMINEIROS

Aqui costumava ser um bosque, antes que asfaltassem a lagoa e derrubassem os jasmineiros da clareira para construir o condomínio ironicamente chamado “Bosque dos Jasmins”.  Agora só me resta essa varanda, essa roseira mal-podada com alguns botões de flores murchos e a mesa de piquenique, onde escrevo pondo tanta força na caneta que a lateral da minha mão direita já está manchada de tinta preta. Confesso, vergonhosamente, que deixo as cinzas e as bitucas dos cigarros caírem ao chão, talvez matando mais um pouco daquela terra pobre e já doente. Sou vencida nessa Terra pobre e doente. Mas escrevo. Tiro as palavras de minhas vísceras enfraquecidas, da minha alma rasgada, da minha cabeça turbulenta. Não sinto a menor necessidade de viver do lado de fora de mim. Em Maio, me lembro bem, as amoreiras estavam vazias, e eu, cheia de esperanças de que ele voltaria dentro de alguns anos, ou mesmo neste verão, no próximo outono, talvez. É o mês da independência (quanto tempo eu não esperei para que Setembro chegasse!), mas me sinto tão dependente quanto estive no último verão: das garrafas de cerveja, da nicotina e das palavras de amores antigos se fazendo novos. Não há um jasmim sequer por essas ruas – eu, pelo menos, nunca mais vi nenhum – e desde que se foi o último jasmineiro, nunca mais me veio visitar um beija-flor no quintal. Mas os pardais vivem invadindo a minha cozinha por entre as grades da janela, e vezenquando uma borboleta adentra meu quarto, ou me deparo com um botão de rosa que deu certo. Esse pouco me basta. O calor que se fez durante todo o inverno se foi, e é engraçado que justo a Primavera traga consigo essas chuvas finas. Posso fazer de conta que são como as chuvas inglesas e que sou a rainha Victoria, valsando pelos jardins do Palácio de Buckingham. Posso continuar preparando meus chás de menta e chocolate sempre que os ponteiros marcam às cinco da tarde e o céu começa a ficar cor-de-rosa, e, quando escurecer, debruçar-me em minha janela e ter longas conversas com a Estrela D’Alva (que, todos sabem, é na verdade um planeta). Na [minha ir]realidade, não há muito que eu não possa fazer. Ainda espero que as fadas voltem e continuo esperando que os cogumelos cresçam no quintal. Continuo, principalmente, esperando pela sua ligação toda noite, para ouvir a sua voz de sorriso e te imaginar rindo do outro lado da linha. Espero. E ainda que asfaltassem todo o oceano, e ainda que já não mais houverem clareiras repletas de jasmineiros, e ainda se os pomares nunca mais se carregarem de amoras à cada primavera... ainda assim, esperarei por você, para que se sente à minha frente, na mesa de piquenique, e então partilharemos nossos vícios   um por um juntos (sendo que ainda és um dos maiores de todos).

1.9.11

Tudo está bem quando acaba bem

Chegava em casa após um dia cansativo no consultório e desabava na poltrona de couro falso da sala. Você estava sentado ao piano preto e velho como o Gênesis, que compramos usado.  Alto, cachos escuros, olhos verdes e mãos grandes de dedos compridos que corriam com agilidade pelas teclas empoeiradas, a ansiedade fazendo-te errar as notas vezenquando (confesso que eu nem sequer percebia). Eu nunca soube distinguir a nona sinfonia da quarta, ou Beethoven de Mozart, então te implorava que tocasse para mim o tema d’A Bela e A Fera. Você me atendia e eu cerrava os olhos, sorrindo e cantando a letra quase num sussurro. O “pequeno” Muffin – nosso gato gordo e amarelo – se enroscava nos meus calcanhares e ronronava, satisfeito, quando eu lhe coçava atrás das orelhas. Depois de toda uma tarde proferindo a cura pela palavra, como a boa psicanalista que eu tentava ser, eu era submetida à sua terapia de cura pela música – sua música, amadora, que eu adorava! Me levantava e caminhava em sua direção, envolvia tua cintura com meus braços gelados e te beijava a nuca. Gostava quando você se arrepiava ao meu toque e murmurava “Catarina...” com um esboço de sorriso nos lábios, meio torto para o canto direito. E não parava de tocar, incessante e aos tropeços. Ao fim da música, me beijava várias vezes, pelo rosto inteiro – olhos, maçãs, testa, queixo, boca... –, e palmas das mãos e ombros.
Há dezoito anos atrás, era essa a nossa fantasia sobre hoje. Lembra, Valentim? Mas agora você está sentado do outro lado da mesa, há um anel dourado na sua mão esquerda e meus dedos permanecem completamente nus, como sempre estiveram. E nunca me tornei a psicanalista bem-sucedida que imaginávamos que eu seria, embora haja um divã ao lado da cama que divido com minha bela e talentosa jornalista recém-formada, e eu dê aulas de psicanálise em uma universidade particular. Você, afinal, se tornou o biomédico que sempre desejou, e admito (com certo embaraço) que ainda não sei bem o que um biomédico faz. Agora você está me dizendo o quanto eu estava bonita naquele vestido cor-de-rosa de madrinha, no seu casamento,e segura as minhas mãos enquanto diz isso. Somos grandes amigos agora, acho sua esposa adorável (aliás, mande lembranças à Alice!) e se dá muito bem com minha Susanna, que ela também acha adorável. Nós quatro costumamos freqüentar os botecos da Paulista em encontros bregas de casaisinhos, e Susanna sempre dirige na volta porque nós outros estamos um tantinho embriagados. Minha namorada é mesmo adorável (eu adoro essa palavra e não me canso de repeti-la), uma pena que deteste gatos, mas estamos contentes com nossos vários vira-latas. Enfim, sou oficialmente uma escritora publicada, ainda que miserável e não renomada, e parei de fumar no último outono. É Setembro e está tocando Los Hermanos ao fundo (Último Romance!) e o chopp está acabando – Garçom! Mais dois! – e estamos dando risada dos nossos planos adolescentes bobos.
E como já dizia o velho do conto, e nunca me esqueço: “tudo está bem quando acaba bem.”