“Ta vendo? Não dói.” Cecília
sussurrava para Cecília. Mas não era ela.
E isso realmente importava? A
resposta era não.
Eram como lágrimas vermelhas que
escorriam pelo ralo do banheiro. Não doía. Era um tratamento, aquilo sim, muito
melhor do que as pílulas, e as gotas de placebo que obrigavam-na a engolir com
todas aquelas palavras brutas, com toda aquela (ir)realidade. E a menina ia
engolindo mais. E a angústia anestesiava e as veias latejavam e seus soluços
faziam com que cada milímetro de seu corpo estremecesse de prazer. Sim, prazer.
Não havia remédio que não causasse doença e não havia doença que não chegasse
ao fim.
Que analogia bonita era o fim! E
que sentimento belo era a dor quando sentida daquela maneira. Lutar pela
lucidez ia a exaurindo e Cecília (mas não era ela) sussurrava em sua própria
mente: vai, menina, desse jeito tudo vira poesia. Essa história não a tornava
mais humana? Pois era isso que a humanidade toda sempre faz: dar murro em ponta
de faca.
A cabeça enfiada embaixo do
chuveiro, de olhos fechados, a pulsão de vida insiste em ofegar: “o pulso ainda
pulsa, o corpo ainda é pouco”. Desejava escapar do corpo, queria fugir do mundo,
que as lágrimas escorressem por todos os poros feito suor. Só acabava por doer
realmente quando se debatia, como quem num redemoinho de rio gasta as energias
para alcançar a superfície.
Precisava dormir.
E quando a salvassem... ah, se a
salvassem!
Como iria arder na manhã
seguinte.
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