28.10.11

De olhos fechados

"Saudade de você."
"Também to"
"Sinto sua falta"
"Sente não"

Bárbara, que era de poucos sorrisos, sorria pra Maria Elena e se explicava "sorrio é porque gosto de ti". Sorrisos desajeitados-enferrujados e mentiras bem-contadas, pensou Flora mais tarde.

Suspiro.

"Sinto, sim"
"É tédio. É solidão."
"Solidão sempre foi."
"Pois então."
"Mas agora é mais. É solidão de você."

Maria Elena costumava passar os braços compridos ao redor da cintura da menina, depois colava o rosto no dela e guardava o momento na caixinha de antidepressivos pra tomar mais tarde, na hora do café e dos remédios; pseudo-zen à beira de um ataque de nervos que era. Passava vários instantes assim. Media o tempo desse jeito: em instantes. Repetia o "gosto de ti", pegava um cigarro, punha entre os lábios. Bárbara perguntava: é o primeiro? Terceiro, Maria respondia, e então guardava, e beijava-lhe a testa com a boca de cinzas porque queria cuidar dela. Costumava, só. Não queria dizer

"Não fica sozinha de mim. 'Tamos aqui, não?"
"Quero te ver."
"Abre os olhos."
"Você ta na minha cabeça."
"Abre os olhos."
"Se eu abrir, você sai dela."

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